Há 84 anos ele dirige no Estado e não abre mão do trabalho
Aprendeu a dirigir na época em que o fio do bigode valia mais que documento
“Se se eu contar pra você que eu dirijo desde os oito anos, você acredita?”. Foi dessa forma que seo Fortunado de Assunção Loureiro Filho, 92 anos, começou a contar sua história de vida. Ele é um dos motoristas mais idosos na ativa em Campo Grande e se enche de orgulho ao falar sobre sua rotina.
Ele conta que naquele tempo, tudo era bem diferente. “Comecei a dirigir um daqueles Fordinhos, com roda de pau, na fazenda. Não tínhamos comunicação, telefone, nada. Eu nunca tive professor e nunca fui em autoescola. Nunca estudei, mas nasci no serviço. Sai da fazenda aos 22 anos para ir ao quartel. Naquele tempo não se alistava, eles iam buscar a gente em casa para servir”, relembrou.
O idoso de sorriso fácil e humor sem igual, lembra que dirigiu sem habilitação até os 27 anos e tirou sua primeira autorização para conduzir veículos automotores em 1956, na cidade de Cuiabá. “O Estado nem era dividido ainda”, lembrou.
Filho de uma família com 14 irmãos, seo Fortunato Nasceu no município de Bonito, “que na época obedecia à comarca de Miranda”, comentou. E foi ali mesmo, na Fazenda Santa Manoela, às margens do Rio Prata, ajudando o pai nas coisas do campo, que ele aprendeu a ‘guiar’.
Sua primeira habilitação era a carteira que hoje classificamos como D, para dirigir caminhões. Durante muitos anos, trabalhou como caminhoneiro. Viajava o Estado todo entregando cal nas propriedades do interior. Hoje, o aposentado pediu o rebaixamento da categoria. “Não dirijo mais caminhões, mas ainda trabalho e vou por toda parte dessa cidade vendendo minhas coisas”, contou orgulhoso.
“Mas o senhor ainda trabalha?”, perguntamos. “Claro. Essa é a vida do artista, minha filha. O serviço não atrapalha ninguém. É saúde!”, respondeu rapidamente. Viúvo há sete anos, o motorista que se orgulha da rotina de quem acorda todos os dias às 5h da manhã para preparar o próprio café, assistir ao noticiário e sair para o trabalho, conta que revende peças usadas em bairros de Campo Grande. “São peças de brechó, casacos, tocas, cadeados, relógios. Tenho de tudo. Coloco as peças no meu carro e saio para vender”, conta o idoso.
Com a CNH recém renovada, ele diz que as filhas ainda se preocupam com o ritmo de vida que ele leva, dirigindo quando o reflexo já não é o mesmo de anos atrás. No entanto, ele enfatiza. “Meus documentos estão em dia, eu tenho direito de dirigir. Então, eu vou mesmo”, falou entre risadas.
Sobre as mudanças das últimas décadas no trânsito de Campo Grande e do Estado, ele é enfático. “Para as pessoas que não respeitam as leis, ficou pior. Mas, para quem anda de acordo com os limites, ficou ótimo. Temos mais segurança. Não tem essa de passar sinal fechado, desrespeitar motoqueiros, pedestres, idosos nas ruas”, afirmou.
“No meu tempo o compromisso era no fio do bigode, hoje em dia, tem que multar mesmo porque só assim para as pessoas entenderem que não podem andar errado”. Às vezes seo Fortunato, que dirige respeitando os limites de velocidade das vias, leva umas buzinadas no trânsito, mas diz que encara tudo com bom humor. Esboçando mais uma vez seu sorriso, ele faz sinal com a mão. “Vamos embora!”, demonstra. “Se todos fossem gentis uns com os outros, não tinha briga no trânsito, não”
Pai de três filhas biológicas e uma do coração, seo Fortunato tem onze netos, oito bisnetos e adora casa cheia, mas detesta bebida alcoólica. Sobre o segredo da longevidade e do bem viver, ele é certeiro: “Fé em Deus, no Espírito Santo, boa alimentação e boas relações com os seus médicos. O que eu tinha de fazer, eu já fiz. A vida é especial e maravilhosa. Queira viver”, concluiu.
A história do seo Fortunato foi gravada pela equipe de Comunicação do Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul) e será veiculada em comemoração ao Junho Prata, de conscientização pelo fim da violência contra idosos.
Assista aqui ao vídeo com a história do seo Fortunato